domingo, 26 de outubro de 2014

Deus não está morto – filme "bonitinho", mas ruim.

“Deus não está morto”. Já tinha ouvido falar desse “filme sensação”, mas ainda não tinha me interessado em assistir até que minha irmã de 14 anos disse que era um “filme bonito” e interessante. Daí, passando pela página inicial do “Netflix” vi o anúncio de sua disponibilidade e apertei o “play”.
Penso que meu primeiro contato em relação à notícia da existência desse filme, divide-se em 02 momentos bastante específicos: a tendência de um grande número de pessoas postarem “Deus não está morto” nas redes sociais que, por sua vez, me levou a procurar a respeito do que se trata e descobrir se tratar de um filme, buscando a crítica no Francisco Russo no site “Adoro Cinema”, “meu site oficial” de consultas sobre a sétima arte.
Comecei a assistir ao filme sem grandes expectativas – e que bom que foi assim.
Um pouco sugestionado pela crítica lida meses atrás, já sabia que não deveria esperar um filme que apresentasse grandes indagações filosóficas, mas sim, um filme voltado a satisfazer o público a que se destina: os cristãos. E penso que o filme fez isso até bem demais (e isso não é um elogio).
Antes de mais nada, achei no mínimo curioso o fato de o filme ter entre seus protagonistas dois atores conhecidos por terem sido, um “o filho de Zeus” (Kevin Sorbo da série de TV “Hércules”) e outro a representação cultural do “messias judeu”, mais conhecido como "Superman" (Dean Cain, o Superman da série Lois & Clark). Mas vamos em frente.
O filme “Deus não está morto” é exageradamente tendencioso. Faz com que os ateus pareçam idiotas histéricos (não que muitos não sejam), também faz com que os descrentes do que não seja o cristianismo sejam intolerantes desarrazoados e incapazes de conviverem com pensamentos diferentes, ao passo que, durante todo o tempo, os cristãos são abnegados e incompreendidos pregadores à serviço de um propósito nascido em seus corações por meio da providência divina.
Se todos os caminhos levavam a Roma, em “Deus não está morto”, todos os acontecimentos convergem para que o “cristianismo” seja o único caminho admissível, seja como razoável, seja como inevitável. E isso agrada muito... apenas aqueles cristãos que vibram por verem os ideais plantados no seu íntimo ganhando voz e vida diante de seus olhos, na representação de um fiel resoluto, capaz de suportar toda sorte de pressões de família, namorada, professor e colegas de turma para, no final, ser “glorificado” por sua atitude diante de uma multidão que assistia um show (?) em que se anunciava “the King is coming” (o Rei está voltando).
O filme não propõe um diálogo com as outras religiões monoteístas e nem leva a sério o pensamento ateísta. Antes, anuncia (até “sutilmente”) que os grandes filósofos ateus foram pessoas que acreditaram em Deus, mas como pediram algo e ouviram “não”, ficaram de bico e preferiram acreditar que Ele não existe para, quem sabe assim, se vingarem de Deus.
Nesse ponto, sempre tive minha convicção em relação a dois dos filósofos e cientistas citados pelo professor no começo do livro: Nietzsche e Freud não eram ateus. Até podiam se anunciar como se fossem, mas sempre os imaginei se afirmando ateus, olhando pra cima e sorrindo sarcasticamente, mais empenhados em “se vingarem” de um Deus a quem atribuíam grande parcela de responsabilidade por suas mazelas (basta que lembremos que Nietzsche era filho de um pastor protestante que se ocupou mais da igreja do que da família e Freud era filho de judeus).
Outro ateu do filme é caracterizado em sua indiferença em relação ao sofrimento da mãe e à doença da namorada, passando a impressão de que o fato de não acreditar em Deus faz com que a pessoa seja – consequentemente – ruim. E no fim, todos os que não criam, creem pelo medo do que virá já que a morte se anuncia (o que me parece a parte mais verdadeira, já que não estamos prontos para pensar que o final da vida é, de fato, o fim da existência e, então, buscamos um alento no porvir que esperamos que nos virá).
O filme, em sim é um “ode à apologética”. Imagino o prazer orgástico que os entusiastas dessa vertente da teologia devem sentir quando veem muitos dos seus sofismas reproduzidos de modo a calarem “cientistas” e convencerem “descrentes”. Chega-se, inclusive, a se incorrer no erro comum de se atribuir a Dostoievski uma frase escrita por ele em "Irmãos Karamazov", mas que ele nunca escreveu, mas isso é pra outra história.
No entanto, de todos os 112 minutos de filme, há um trecho que achei muito bom. À certa altura, a mãe de uma das personagens, já com a demência tão avançada quanto os anos sugeridos pelas marcas do tempo de seu rosto, quase como estando num estado de transe semelhante ao das pitonisas (ou do oráculo do “Matrix”), diz ao filho o que me soou com uma verdade que posso aplicar para mim que acredito que exista algo como o diabo:
“Às vezes o diabo permite que as pessoas vivam livres de problemas porque ele não as quer voltando-se para Deus. Seu pecado é como uma cadeia, mas ela é boa e confortável, não parece haver razão para sair dela. A porta está aberta até um dia que o tempo acaba e a porta da cela bate e, de repente, é tarde demais.”
Precisamos ter cuidado para não nos sentirmos confortáveis no enlameado de nossos próprios erros.
Assim, como bem disse minha irmã, apesar de tendencioso, fraco e previsível, o filme é “bonito”. E eu concordo com seu título. DEUS NÃO ESTÁ MORTO. Mas não acho que seus idealizadores foram felizes na forma de dialogar com o resto do mundo que, a despeito de não crerem igual, não são ruins.


ps.: ao final do filme há uma mensagem afirmando que o filme foi elaborado a partir de situações que geraram processos judiciais por perseguição que alunos de universidades americanas sofreram de professores que não aceitavam suas crenças. Isso também é lamentável. Ninguém é intelectualmente menos favorecido porque optou ter fé. É preciso de fé tanto para crer em Deus quanto para não crer em Deus. E penso que isso o filme foi bem capaz de demonstrar.

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